sexta-feira, 4 de junho de 2010

O sol é para todos (To kill a mockingbird)



Estava eu aqui em casa à noite enrolada no cobertor quando decidi ver um dos filmes que comprei e estava esperando a ocasião oportuna para ver. Um deles é O Sol é para Todos (To kill a mockingbird, 1962), o outro é Adivinhe quem vem para jantar (Guess who's coming for dinner, 1967). Já havia assistido o Adivinhe... antes, mas O Sol... não. E posso dizer que o filme é tudo aquilo que as pessoas me alardearam: roteiro bom, com atuações impecáveis, com uma história incrível, com uma montagem de época também incrível, com uma temática muito boa e atual para a época em que foi feito.

É muito difícil avaliar um "clássico" porque ele já foi avaliado tantas vezes, que a gente até se perde nos comentários. Ou sempre tem uma pessoa que é hiper entendedora de cinema e que detalha coisas que não você às vezes não sabe. Mas sabe como é, eu não sou cineasta...então minha proposta apenas é dar minha opinião, fazer uma crítica (leiga) dos filmes que estou assistindo. Dito isso, vamos lá.

O sol é para todos (prefiro o nome em inglês, para falar a verdade)conta com a atuação de Gregory Peck no papel do fantástico advogado Atticus Finch, na pequena cidade de Maycomb, no Alabama, em 1932, onde vive com seus dois filhos pequenos, Scout, de 6 anos, e Jem, de 10 anos. Nessa cidade, no estado mais retrógrado em relação a luta racial nos Estados Unidos, ocorre um caso de estupro e o acusado é um negro, que se diz inocente. Atticus resolve defender esse homem, e começa a sofrer também perseguições, ele e sua família, por causa disso.

O interessante na história de O Sol... é que os acontecimentos são narrados e vistos pelo olhar das crianças, seus filhos, numa idade em que elas estão começando a descobrir coisas novas. Uma delas é a pobreza, a outra a intolerância racial e a outra é a simples maldade humana.

As personagens dos filho de Atticus se juntam a Dill, criança vizinha deles que só passa férias na região (que no making off descobri que é a homenagem da autora a Truman Capote quando criança), e começam a explorar os mistérios da casa na vizinhança, de Boo Radley, homem que vive confinado em casa. Esta casa, quase mal assombrada na visão dessas crianças, é envolvida de mistérios pelos moradores da região. Como são crianças curiosas e livres, pois a cidade é pequena e todos se conhecem, Scout e Jem vivem rodando ela, encontrando outras personagens, e seguindo o pai aonde ele fosse.

A partir dessas aventuras infantis, Scout e Jem, Jem mais que Scout, devido à idade, começam a perceber que há algo errado na cidade e que envolve seu pai. Jem fica quieto, mas Scout está numa fase questionadora, perguntando tudo ao pai. Seu pai, de forma emblemática, responde: tem coisas que acontecem que são muito ruins e vocês não tem conhecimento. E Scout começa a tomar conhecimento, quando vê seu pai ser ameaçado por um habitante e chamado de "amante de negros" ("neiger lover", bastante ofensivo) e também no próprio julgamento de Tom Robbinson, o home negro acusado de estuprar a menina branca.

Outra conversa importante no filme, em que Scout começa a descobrir o que está acontencendo, e perdendo de certa forma sua inocência, é com a empregada da família, Cal, que também é negra. Cal conversa com Scout e afirma que existem algumas pessoas que fazem um trabalho ruim e que são corajosas. Uma delas seria Atticus, pai de Scout.

O roteiro do filme, baseado na história do livro de Harper Lee, com nome homônimo, é extremamente bem pontuado pois aos poucos nos coloca o olhar dessas crianças sobre a cidade em que vivem, desenvolvendo os acontecimentos no ponto de vista das crianças. No início, uma cidade idílica, com muita natureza, com muito espaço livre para se brincar, onde todos se conhecem, onde não há violência. Assim a narradora do filme, a própria Scout, mais velha, define a pequena cidade de Maycomb (inspirada na infância da própria Harper em Monroeville, Alabama), até o ano em que começaram a acontecer as "mudanças". Nessa cidade idílica, num momento de depressão econômica, a vida das crianças é simples, sem perceber os problemas que assolam os moradores da pequena região. Logo no início, Scout descobre o que é a pobreza, quando um fazendeiro simples deixa como pagamento por serviços prestados por Atticus um saco de nozes. Scout chama prontamente seu pai para recebê-lo e o homem embaraçado, que pretendia só deixar o saco na porta, é obrigado a ficar de frente com o homem que deve. Outro momento que relata a depressão econômica é quando o filho desse fazendeiro, que estuda com Scout, é convidado por Atticus a almoçar na sua casa. A menina prontamente fala que ele come como desesperado e pergunta se não há comida em sua casa. Imediatamente, é repreendida por Cal, que explica que "não se deve dizer essas coisas para os menos favorecidos".

O conflito racial é o tema do filme que perpassa todo o fio da história das lembranças de Scout sobre os acontecimentos da cidade naquela época. Tom Robbinson, homem negro e casado, é acusado de estuprar uma jovem branca, filha de um fazendeiro, confusa e acuada pelo pai violento, que só aparece no momento do julgamento. Uma das cenas mais bonitas do filme e mais forte talvez não está no julgamento nem no discurso de Atticus sobre o preconceito das pessoas, mas no dia anterior ao julgamento, quando o próprio Atticus é chamado pelo delegado para vigiar a prisão onde estaria Tom. As crianças, curiosas, correm atrás de Atticus, vigiando escondidas ele no pórtico da prisão, sentado e lendo, quando chegam os homens com armas e paus e cheios de ódio, querendo matar Tom. As crianças, quando vêem o pai ameaçado, correm logo para perto dele, assustadas. Quando o pai pede para que o filho volte, Jem diz que não, e permanece com sua opinião, apoiando o pai, mesmo com ele exigindo seu retorno. Scout, por sua vez, reconhece o fazendeiro que pagava dívidas a seu pai em alimentos e pergunta para ele porque ele não conversava com ela, como faziam quando ele ia à sua casa. Ainda acrescenta que estudava com seu filho e que ele era muito bom menino. Após essa situação tensa, os homens se retiram do local, envergonhados pela situação e pela inocência das crianças.

Outra coisa que chama a atenção no filme e que está presente no making off é a situação dele não ter uma denominação. Não era um filme de romance, não era de ação nem aventura, não era terror, nem drama de soltar lágrimas. Era apenas um filme sobre a inocência das crianças, por meio da discussão racial que era algo muito presente na época em que foi feito. Talvez por isso ele seja tão bom: sua proposta não é entreter o espectador com cenas cheias de emoção, mas sim fazê-lo sentir uma época boa da nossa juventude, uma época sem problemas, mas que aos poucos vai sendo tomada da gente pela vida adulta. Nesse sentido, O Sol... nos traz de volta os melhores momentos da infância e nos faz refletir sobre nossa própria conduta na vida adulta, e o porque dos homens mudarem tanto com o tempo.

Um comentário:

  1. Eu li o livro O sol é para todos na minha adolescência e mais tarde vi o filme. Como na minha infância convivi com amigos pobres ou negros, não entendia muito bem o porquê dessa situação. E aí a imaginação corre solta. Esse livro foi bem marcante pra mim. Seus comentários combinam com o que eu penso sobre o filme.

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