Talvez eu esteja muito ligada à minha profissão, e não consegui ver o filme com olhos apenas de espectador. De fato, fiquei analisando o realismo e a veracidade dos acontecimentos do longa, pois é uma coisa que faço geralmente com filmes históricos. Vi 12 anos de Escravidão e gostei - mas não o achei sensacional ou atual.
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Escravos no mercado em Alexandria, VA (maior mercado de escravos dos EUA) |
Excelentes atuações, especialmente de Chiwetel Ejiofor, que interpreta Solomon Northup, e de Michael Fassbender, que faz o dono de escravos Edward Epps. Porém, ouvi comentários de pessoas dizendo que ficaram chocadas e o acharam extremamente pesado. Eu particularmente não achei. Uma cena ou outra, mas no geral, o filme me pareceu ser aquilo que o roteirista propôs ser: realista.
Não há novidade nenhuma nas cenas de terror psicológico, físico, castigos e outros infinitos tipos de tortura possíveis efetuadas em escravos ao longo da vergonhosa história do trabalho no novo mundo. Acho que o longa traz indignação a muitas pessoas, mas o realismo retratado já deveria estar presente no imaginário da população. São décadas e décadas de trabalho de historiadores e professores para mostrar que a escravidão foi uma realidade cruel, foi um sistema complexo se pensarmos na objetificação de seres humanos (em sociedade religiosas cristãs) e trouxe consequências terríveis até os dias atuais, que são o preconceito racial e a desigualdade social.
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Chiwetel Ejiofor, interpretando Northup em uma fazenda produtora de algodão na Louisiana |
Algumas cenas são bem interessantes, como o diálogo entre o carpiteiro canadense (Brad Pitt, produtor do longa) e Epps sobre liberdade de escolha e o mal social da escravidão, um adotando a visão clássica escravocrata e outro a visão liberal. Nao foi pra mim muito verídica, pareceu algo bem didático, inserido por Steve Mcqueen por achar necessário. Outra parte interessante é a relação de Patsy com a esposa de Epps, que a invejava, mas nada podia fazer contra a preferida do marido, e Patsy com a vizinha, casada com o seu dono, que se torna ela mesma dona de escravos, outro fato bastante relevante se pensarmos na escravidão como parte de um sistema social naturalizado.
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Lupita Nyong'o que interpreta Patsy (a fotografia do filme é incrível) |
Mas 12 anos tem seu mérito: insiste, na verdade, persiste em mostrar algo que deve ser relembrado constantemente. Que venham outros filmes então. Não vejo o filme como o melhor e mais emocionante dos últimos tempos no cinema, mas o vejo particularmente como um filme realista e relevante, que serve pra levantar, mais uma vez, o debate sobre as consequências do mal escravocrata em sociedades ocidentais, como a nossa.
Destaque para a fotografia, figurino (o jogo de cores é deslumbrante) e a direção do filme, acho que estão sensacionais. E Anima Cris, concordo com você, talvez escolhesse outros filmes para trabalhar em sala. Mas este serviria como bom exemplo de uma biografia de tristeza e de luta, que tem um final relativamente feliz (pois Northup jamais será o mesmo), com algumas cenas bem interessantes de trabalhar. No caso de milhões de escravos que nunca experimentaram a liberdade, o final não foi tão feliz assim.
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Michael Fassbender e Chiwetel Ejiofor, dono e escravo que contracenam nas cenas mais tensas do filme |
(Publicado em 09.03.14 no facebook)
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